sábado, 7 de junho de 2014

Reação da direita à participação popular


Editorial do siteVermelho:

A tradicional - e secular - contradição entre democracia representativa e participativa reapareceu, com força, no cenário político desde a publicação, no Diário Oficial da União (em 26 de maio) do decreto nº 8243, que institui a Política Nacional de Participação Social - PNPS - e o Sistema Nacional de Participação Social – SNPS.

A reação da direita e dos conservadores ao decreto 8243 expôs uma questão mais profunda a respeito da organização do Estado democrático moderno – o problema mais geral do exercício da soberania.

O parágrafo único do artigo 1º da Constituição de 1988 diz, sem ambiguidade: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Isto é, o soberano é o povo, que exerce o poder através de representes eleitos ou diretamente.

Esta determinação constitucional democrática provoca alergia nos setores mais conservadores e isso pode ser observado na reação provocada pelo decreto 8243. Os conservadores colocam o limite da soberania popular na cabine do voto, onde seria transferida aos representantes eleitos. Afinal, quem governa é a classe dominante através dos “representantes do povo”. Para ela, o exercício da soberania popular representa um perigo não só em relação ao direito de propriedade – o dogma fundamental do Estado burguês – mas em relação a todos os atos de governo.

A absurda reação contra o decreto é uma demonstração desse temor e revela uma concepção limitada e restritiva de democracia. Os conservadores pretendem manter o sistema político sob seu controle estrito e repetem sucessivas tentativas de limitar qualquer participação popular mais ampla.

Na reação contra a ampliação da participação popular vale tudo, inclusive a má-fé. Um analista da direita chegou ao absurdo de ver o Brasil em situação semelhante à da Rússia às vésperas da Revolução de 1917! Outro enxergou no decreto a “instalação da ditadura petista por decreto”! Houve quem escrevesse que a sociedade civil – que o decreto manda consultar – é formada por “todos aqueles que promovem manifestações, quebra-quebras, passeatas, protestos, e saem por aí reivindicando terra, ‘direitos’ trabalhistas, passe livre, saúde e educação – MST, MTST, MPL, CUT, UNE, sindicatos”! Para outro o decreto é “o passo mais ousado já tomado pelo PT” rumo ao socialismo! Para o jurista conservador Ives Gandra Martins o decreto é “ditatorial” e de inspiração bolivariana; ele invocou assim outro espantalho da direita, o fantasma do presidente Hugo Chávez.

O senador tucano paranaense Álvaro Dias apressou-se a protocolar na última segunda-feira (2) um pedido de decreto legislativo para barrar o decreto 8243, e teve a companhia de um leque de agremiações, formado por nove partidos (DEM, PPS, PSDB, Solidariedade, PR, PV, PSD, PSB e PROS).

A qualificação usada pelo senador tucano para avaliar o decreto nada fica a dever ao delírio direitista descrito acima. Disse que o decreto é inconstitucional, demonstrando não ter lido atentamente a Constituição de 1988. E, num rasgo de sinceridade, alegou que a Carta Magna não se refere à “ampliação do sistema de representação popular”! Para ele, o decreto significa a “falência do Poder Legislativo federal e o sucateamento total e absoluto do Congresso Nacional”.

No editorial “Mudança de regime por decreto” (publicado em 29 de maio) o jornalão paulistano O Estado de S. Paulo, por sua vez, viu uma tentativa do governo de “modificar o sistema brasileiro de governo” e “a ordem constitucional”. E foi claro sobre a forma como compreende o funcionamento da democracia: “a participação social numa democracia representativa se dá através dos seus representantes no Congresso, legitimamente eleitos”.

Uma leitura atenta do texto do decreto não ratifica o delírio antidemocrático da direita e dos conservadores. Nele, o objetivo é, diz, “fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”; e determina que, na “formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação de programas e políticas públicas e no aprimoramento da gestão pública serão considerados os objetivos e as diretrizes da PNPS”.

A leitura do decreto deixa claro que se refere às ações do Poder Executivo, nada determinando em relação ao Legislativo, mesmo porque uma alteração desse porte, como alega a reação direitista e conservadora, só poderia ser feita através de emenda constitucional ou de uma nova assembleia constituinte.

Trata-se, contudo, de um passo importante para ampliar e fortalecer a democracia e o protagonismo popular. Passo que se insere no quadro de mudanças políticas que ocorrem desde 2003. A direita e os conservadores reagem em defesa de seus privilégios. Mas os brasileiros querem mais democracia e este é o sentido da mudança preconizada pelo decreto 8243, cujo objetivo é envolver a população e o povo organizado nas decisões políticas de que o país necessita.

Um comentário:

  1. Na reação contra a ampliação da participação popular vale tudo, inclusive a má-fé. Um analista da direita chegou ao absurdo de ver o Brasil em situação semelhante à da Rússia às vésperas da Revolução de 1917! Outro enxergou no decreto a “instalação da ditadura petista por decreto”! Houve quem escrevesse que a sociedade civil – que o decreto manda consultar – é formada por “todos aqueles que promovem manifestações, quebra-quebras, passeatas, protestos, e saem por aí reivindicando terra, ‘direitos’ trabalhistas, passe livre, saúde e educação – MST, MTST, MPL, CUT, UNE, sindicatos”! Para outro o decreto é “o passo mais ousado já tomado pelo PT” rumo ao socialismo! Para o jurista conservador Ives Gandra Martins o decreto é “ditatorial” e de inspiração bolivariana; ele invocou assim outro espantalho da direita, o fantasma do presidente Hugo Chávez.

    ResponderExcluir