sábado, 5 de maio de 2012

Carta Capital denuncia Civita, um dos Murdoches brasileiros


Do Jornalismo B

4MAI
A revista Carta Capital fecha a semana colocando nas bancas uma edição que certamente dará o que falar entre a mídia independente e que provavelmente será, como costuma acontecer, ignorada pela mídia dominante no país. Quem está na capa é Roberto Civita, o “nosso Murdoch”, como bem coloca a manchete da revista.
Por maior importância jornalística que possa ter o trabalho desenvolvido pela Carta Capital, dificilmente as reportagens ali publicadas obtêm qualquer tipo de repercussão nos veículos da grande mídia. Exatamente o contrário do que acontece em casos semelhantes que envolvem apenas os conglomerados de comunicação: Folha, Estado, Abril e Globo alimentam uns aos outros com o jornalismo podre que recolhem sabe-se lá de onde, tal qual um grupo de abutres solidários entre si e despreocupados com o resto.
A Carta Capital, em sua capa, levanta um tema e uma comparação fundamental, já levantada antes em diversos blogs, inclusive AQUI no Jornalismo B: por que na Inglaterra o reino de Murdoch é investigado enquanto aqui no Brasil os desmandos e ilegalidades cometidos pelos grandes conglomerados de comunicação sempre ficam impunes?
Há uma grande conivência e harmonia entre grupos supostamente concorrentes. Cada um ocupa seu espaço, alguns com nichos de público diferenciados, e, sem ataques recíprocos, mantêm seu poderio e sua capacidade de evitar que novas iniciativas ganhem espaço. Mantêm também a coesão, ao menos parcial, entre seus discursos. Sua linha editorial varia pouco, assim como variam pouco seus anunciantes.
É importante – e, felizmente, parece inevitável – que a mídia independente se encarregue de, durante a próxima semana, repercutir ao máximo a capa da Carta Capital. Discutir a ética da atual mídia hegemônica é básico para passarmos a uma discussão a respeito do modelo de comunicação que alimenta esse tipo de jornalismo. Civita é apenas um dos Murdoches brasileiros. Temos uma dezena a desmascarar. 

As faces e a alma do marxismo



Por Osvaldo Bertolino
Acaba de vir à luz, pelas mãos da editora Anita Graibaldi e da Fundação Maurício Grabois, a coletânea intitulada ""Marx como pensador" — textos do intelectual alemão Rolf Hecker, que está no Brasil para divulgar a monumental obra de publicação dos trabalhos originais de Karl Marx e Friedrich Engels, conhecida como Mega-2. São oito artigos que discorrem sobre o Marx crítico da economia, o Marx filósofo, o Marx historiador, o Marx jornalista, o Marx político, o Marx das ciências naturais, sobre o “problema Marx-Engels”, sobre a história das edições das obras dos pensadores alemães, sobre os monumentos de Marx na Europa e sobre o que se sabe de Marx.
Na apresentação, o historiador Augusto Buonicore dá uma pitada do que vem em seguida, lembrando as mortes e ressurreições do marxismo. “A cada vez que uma crise assola o sistema — e os povos sentem na carne suas conseqüências nefastas e se rebelam —, a figura de Karl Marx se revigora”, escreveu. E acrescenta: “Afinal, não foi ele quem descobriu os mecanismos ocultos das crises do capitalismo e deu pistas para a sua superação? Contudo, parece que a necessidade de conhecer mais e melhor as obras marxistas não se reduziu, desta vez, às principais vítimas do capital: os trabalhadores.”

Buonicore esclarece que o texto do professor Rolf Hecker que a Fundação Maurício Grabois disponibiliza é resultado de uma conferência realizada em meio às atividades alusivas aos 125 anos da morte de Marx, em 2008. Seu objetivo era “analisar como mudaram nossas representações sobre Marx e sua obra nos últimos 15 anos”. Segundo o historiador, que também é secretário-geral da Fundação Maurício Grabois e presidente do Centro de Documentação e Memória (CDM) dessa instituição, Rolf Hecker é um profundo conhecedor das obras de Marx e Engels, especialmente das virtudes e vicissitudes de suas edições.

Nos textos, Hecker passeia pela história das obras dessas personalidades antológicas, especialmente de Marx. Ele relata um acontecimento que simboliza como poucos a grandeza desse pensador original. Segundo o professor, todos os anos milhares de pessoas visitam o túmulo de Marx no cemitério Highgate, em Londres. Em 11 de novembro de 2007, o jornalFrankfurt Allgemeine Sonntagszitung publicou que “Marx é um grande pensador, uma personalidade da história mundial, e merece respeito”. A “Casa de Karl Marx” em Trier, Alemanha — o único museu especial dedicado a Marx no mundo, e que recebeu em 2010 a visita de 40.233 turistas, entre os quais mais de dez mil provenientes da China —, escreve Hecker, foi reaberta em 9 de junho de 2005.

A alma do marxismo
Mais do que o museu, as obras de Marx são visitadas em todas as partes para se compreender o que se passa atualmente, confirmando as palavras de Engels em seu funeral, segundo as quais o nome e a obra do mais famoso pensador alemão atravessaria os séculos. Seu pensamento enfrentou e venceu diferentes fixações fanáticas. Quando não vencem pelos ataques, contudo, apelam para a indiferença em relação à sua alma — a dialética, na definição de Wladimir Lênin. A dificuldade está em procurar compreender o marxismo com espírito científico, isento de paixões e sem a carga irracional de ódio, herdada em boa parte de preconceitos incutidos por anos de anticomunismo. 

Mesmo quando ele não é excluído da categoria de fenômeno social — o marxismo é ensinado até nas universidades norte-americanas —, procuram a todo custo destituí-lo de sua alma. É assim que os espíritos se fecham ao seu conhecimento, possivelmente com medo de a ele se converter. Para compreendê-lo, é preciso compreender a sua essência revolucionária. Trocando em miúdos: para compreender a realidade, é preciso pensar a realidade. Pensar é apreender os fatos pelo pensamento e compreendê-los como processo em contradição — a mola do movimento real das coisas. Logo, se a realidade é dialética e se pensar é apreender a realidade, pensar é apreender dialeticamente os fatos.

Exercício revigorante
O marxismo, independente do que dizem dele os já decrépitos “novos filósofos”, não pode evidentemente ser resumido a um modelo. Os bolcheviques de “têmpera especial” partiram a história em duas, abalaram o mundo, romperam pela primeira vez a estrutura e a lógica do capitalismo e do imperialismo — tomaram o céu de assalto, como dizia o próprio Marx sobre os revolucionários da Comuna de Paris, de 1871 —, mas foram marxistas do seu tempo. O desenvolvimento histórico obriga os marxistas a uma nova perspectiva revolucionária, adequada ao tempo e às condições concretas de cada lugar, de cada realidade.

Nessa constatação está a alma do marxismo, capaz de uma atitude crítica diante de fórmulas tradicionais petrificadas. A conclusão que pode ser extraída é que a sua força não depende dos males elementares do capitalismo. Nem da idéia de um único movimento comunista mundial que, num certo período, atrofiou o pensamento marxista. O marxismo é um método científico. E, nas ciências, a discussão — entre pessoas que sustentam pontos de vista divergentes sobre bases científicas — é o único caminho permanente de progresso. Marx como pensador ensina isso. A leitura dos textos do professor Hecker é o exercício revigorante do qual fala Augusto Buonicore na apresentação do livreto.

O esquema Cachoeira e o governo Serra



CPI e Ministério Público investigam como o grupo do bicheiro Carlinhos Cachoeira atuou em São Paulo através de contratos da construtora Delta com a Prefeitura e o Estado em obras na marginal Tietê

Pedro Marcondes de Moura
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CONEXÃO
Em conversas telefônicas, Cachoeira (acima) fala sobre
contratos públicos em São Paulo nas gestões de Serra e Kassab
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Os desdobramentos da Operação Monte Carlo, que investiga as relações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com governos estaduais e municipais, chegaram ao principal bunker da oposição: o Estado de São Paulo. Em Brasília, parlamentares que compõem a “CPI do Cachoeira” já tiveram acesso a conversas telefônicas gravadas com autorização judicial entre junho do ano passado e janeiro deste ano. Elas apontam que a construtora Delta, braço operacional e financeiro do grupo do contraventor, foi favorecida nas gestões de José Serra (PSDB) e de seu afilhado político Gilberto Kassab (PSD) na prefeitura e também quando o tucano ocupou o governo do Estado. Em 31 de janeiro deste ano, por exemplo, Carlinhos Cachoeira telefona para Cláudio Abreu, o representante da empreiteira na região Centro-Oeste, atualmente preso sob a acusação de fraudar licitações e superfaturar obras. Na ligação (leia quadro na pág. 43), o bicheiro pergunta se Abreu teria conversado com Fernando Cavendish, oficialmente o dono da construtora, sobre “o negócio do Kassab”. Em seguida, diz a Abreu que o prefeito de São Paulo “triplicou o contrato”. Essa conversa, segundo membros da CPI e do Ministério Público de São Paulo, é um dos indícios de que a organização de Cachoeira também teria atuado com os tucanos e seus aliados em São Paulo. “Os depoimentos de Cachoeira e Abreu serão fundamentais para que se descubra o alcance das relações entre a empreiteira e políticos”, diz o relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG). 

A Delta começou a prestar serviços à capital paulista em 2005, quando Serra assumiu o comando do município. Inicialmente, os contratos somavam R$ 11 milhões. A partir de 2006, quando Serra deixou a prefeitura e venceu as eleições para governador, os negócios da empreiteira com o município se multiplicaram, em muitos casos sem licitação. Em 2010, ano em que o tucano disputou a Presidência, os repasses chegaram a R$ 36,4 milhões. Entre 2008 e 2011, os pagamentos da prefeitura para a Delta ultrapassaram R$ 167 milhões. O que chama mais a atenção da CPI e do Ministério Público de São Paulo, porém, é o fato de a Delta ter vencido em outubro do ano passado uma concorrência para limpeza urbana no valor de R$ 1,1 bilhão. O MP abriu um inquérito para apurar se houve fraude na licitação. Há suspeitas de uso de documentos falsos e de edital dirigido. “Se a Delta cometeu essas irregularidades em outros Estados e municípios, precisamos apurar se isso ocorreu também em São Paulo”, diz o promotor Silvio Marques, do Patrimônio Público. Na quarta-feira 2, ele encaminhou ofício à PF, solicitando acesso às investigações da Operação Monte Carlo.
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Entre a papelada, o promotor receberá a transcrição de uma conversa gravada com autorização judicial ocorrida em 4 de agosto do ano passado. No diálogo, a que ISTOÉ teve acesso, um homem identificado como Jorge pergunta para Gleyb Ferreira, segundo a PF uma espécie de “faz-tudo” de Cachoeira, sobre o edital de uma licitação. “E aí, evoluiu aquele negócio?”, pergunta Jorge. “Aguardamos estar com o edital hoje à tarde. O Carlinhos (Cachoeira) quer que a gente converse com o Heraldo (Puccini Neto, representante da Delta na região Sudeste). Já estamos conseguindo uma prorrogação com o secretário para o dia 31 ao invés do dia 15”, responde Gleyb. Para a PF, o diálogo se refere à concorrência de R$ 1,1 bilhão vencida pela empresa ligada ao bicheiro. O Ministério Público já apurou que foram necessários dois editais para a concorrência. No primeiro, a Delta foi desclassificada. 

Se a Delta multiplicou seus contratos com a prefeitura entre 2005 e 2011, um movimento semelhante ocorreu com o governo de São Paulo, quando Serra chegou ao Palácio dos Bandeirantes em janeiro de 2007. Durante o mandato do tucano, a construtora recebeu R$ 664 milhões do governo paulista. O valor corresponde a 83% de todos os 27 convênios firmados pela Delta com o Estado de São Paulo na última década. A obra mais polêmica é a ampliação da Marginal Tietê, um dos cartões de visita da campanha presidencial de Serra em 2010. Além de inúmeros problemas, como atrasos e falta de compensação ambiental, o valor pago ao consórcio Nova Tietê, liderado pela Delta, sofreu um reajuste de 75%. Na quarta-feira 2, o Ministério Público de São Paulo instaurou Inquérito Civil para apurar a existência de irregularidades na licitação, superfaturamento e conluio entre agentes públicos.
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ELE DE NOVO 
Então diretor da Dersa, Paulo Preto, o polêmico arrecadador tucano em 2010,
foi o responsável por contratar a construtora Delta para obras viárias em São Paulo
Segundo documentos obtidos por ISTOÉ, a obra da Marginal era acompanhada dentro do governo de São Paulo por Delson José Amador e Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto, que no PSDB é identificado como um dos arrecadadores das campanhas eleitorais de Serra. Tanto Paulo Preto como Amador são citados na Operação Castelo da Areia, da Polícia Federal, por suposto envolvimento com empreiteiras. Pelo lado da Delta, o responsável pelo gerenciamento da obra era o diretor da empreiteira para a região Sudeste, Heraldo Puccini Neto. Ele está foragido, após ter a prisão preventiva decretada por envolvimento em suposto esquema de fraude em licitações na área de transporte público do Distrito Federal. “A apuração sobre os contratos da Delta com o governo paulista pode levar ao caixa 2 dos tucanos em São Paulo”, afirma o deputado estadual João Paulo Rillo (PT). “Não podemos nos limitar a fazer uma análise política”, diz o líder tucano Álvaro Dias (PR). “Devemos checar todos os contratos da Delta para saber de que forma foram celebrados e se os preços praticados foram justos. Afinal, a empresa foi a principal patrocinadora da relação do bicheiro Cachoeira com os recursos públicos.”
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NOVO INQUÉRITO 
O MP de São Paulo encontrou indícios de conluio entre agentes públicos e
a construtora Delta para fraudar licitacões em obras realizadas na capital
paulista. O promotor vai investigar contratos da gestão Kassab (abaixo)

 
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Colaborou Claudio Dantas Sequeira 

Fale-me sobre política que direi quem tu és...-Memórias de Um Alienado – Parte 3


Memórias de Um Alienado – Parte 3 Fale-me sobre política que direi quem tu és...





















Por André Lux
Dando sequência às minhas "Memórias de Um Alienado" (clique aqui para ler a 
parte 1 e a parte 2), vou falar agora sobre o que aconteceu com minha vida
 depois que deixei de ser um papagaio da direita e fui conscientemente para 
a esquerda.

A primeira conseqüência é positiva. Trata-se, claro, de deixar de ser um boçal 
alienado convicto que fica dado palpite em tudo quanto é assunto sem 
entender nada do que está sendo dito – só para fazer de conta que entende
 ou então, pior, para irritar “esquerdistas”. Quando você passa a ter consciência 
das coisas e “sai da Matrix”, percebe que é muito melhor ficar quieto escutando 
o que os outros tem a dizer.

Isso me ensinou grandes lições que todo boçal alienado convicto não conhece,
 tais como: ser humilde, saber ouvir, entender que quanto mais você aprende 
mais percebe que nada sabe e que não conseguir admitir tudo isso é coisa de
 gente fraca e covarde.

Agora vem o lado ruim. O problema de você sair da direita e ir para a esquerda, 
especialmente quando ainda é adolescente, é o choque de perceber quanta
 gente que antes dizia te adorar vai começar a tratá-lo como o se fosse o
 belzebu em pessoa! Comigo não foi diferente.

Familiares, amigos e conhecidos, que antes apertavam minhas bochechas, 
davam tapinhas nas costas e me elogiavam quando eu concordava com o que 
diziam, de repente passaram a me xingar e agredir só porque ousei defender 
o Lula ou o Fidel Castro. Assim, de “menininho querido da titia” me transformei 
“naquele moleque perdido que sofreu lavagem cerebral dos comunistas”. E de
 nada adianta você tentar dizer que ninguém fez lavagem cerebral em você, 
muito pelo contrário: antes é que faziam...

Comigo foi assim. Lembro até hoje do dia que, depois de deixar de ser um 
papagaio da direita, cheguei em casa e resolvi falar sobre política com meu pai
 – coisa que nunca tinha feito antes. Imaginem a cena. Eu, com 18 anos, todo
 empolgado querendo falar com meu velho sobre aquelas coisas novas que 
tinha aprendido, de repente sendo tratado com um trapo sujo e repelente! 
Sim, foi isso que aconteceu. Foi só eu falar todo ingênuo que ia votar no
 Lula e pronto. Só faltou me dar um sopapo na orelha!

E com minha mãe não foi diferente. Nem com o vizinho, que de velinho 
simpático e bonachão, transformou-se num clone do Adolf Hitler assim 
que eu falei bem do “sapo barbudo”! Meus amigos de infância então, 
nem preciso dizer o que aconteceu, preciso? Óbvio: foi só eu falar da
 minha nova ideologia que começaram todos a me ridicularizar e repetir 
aquelas papagaiadas “para irritar esquerdista”...

Foi nessa época que aprendi uma coisa triste. As pessoas só revelam mesmo quem realmente são e o que pensam quando falam de política. O sujeito pode ser o mais bonzinho do mundo, fã de Beatles, Pinky Floyd e dos filmes de Walt Disney, amante da paz e da natureza, mas na hora que começa a falar de política transforma-se, como aquele meu vizinho, numa cópia mal feita do Hitler e passa a vomitar preconceitos, elitismo, racismo, homofobia, ignorância e outras nojeiras que deveriam deixar qualquer pessoa com bom senso envergonhada. E olha que estou falando aqui de pessoas de classe média, que tiveram acesso a tudo do bom e do melhor em relação a 
estudo e cultura!

Nem preciso dizer que, daquela época em diante, perdi muitos “amigos” 
e deixei de ser o “queridinho” de muitos familiares, que passaram a me
hostilizar ou me irritar constantemente com provocações baratas e ridículas.
 Por que eu não percebia o quanto aquelas pessoas eram rancorosas, odiosas 
e preconceituosas antes, perguntava-me. A resposta é simples: porque antes 
não falávamos de política, exceto talvez para repetir um ou outro jargão idiota 
da direita, do tipo “detesto política” ou “político é tudo igual”.

E tem gente, incluindo familiares e amigos, que ainda fazem isso comigo até hoje. 
Nem preciso dizer também que, depois das duas vitórias do Lula e da ascensão
 de políticos como Chávez, Evo Morales e afins, tudo ficou ainda pior e até 
aqueles que conseguiam disfarçar um pouco melhor seus ódios perderam 
completamente o controle!

Depois de todas essas experiências, criei uma máxima que, infelizmente,
 continua valendo até agora: “Fale-me sobre política que direi quem tu és”...
http://tudo-em-cima.blogspot.com.br/2009/10/memorias-de-um-alienado-parte-3-fale-me.html


Memórias de um alienado: Eu também já fui papagaio da direita...


 




























Por André Lux


Quem visita meu blog e lê meus textos com certeza deve pensar que sou socialista
 desde o meu nascimento e fui criado por pais radicais de esquerda, que fizeram
 treinamento de guerrilha em Cuba e lutaram contra a ditadura militar...

Nada mais longe da verdade. Muito pelo contrário.

Nasci em uma típica família de classe média baixa, mas que sonhava pertencer à elite 
mundial. Daí que, durante toda minha infância e juventude, morei em casas 
(alugadas) em bairros semi-nobres a preços absurdos, enquanto era 
transportado numa Brasília amarela e via meus pais desesperados tentando 
cobrir o rombo no cheque especial todo santo mês.

Mas, como que para provar nossa posição entre a elite, eramos sócios do segundo clube no nível hierárquico sócio-econômico da cidade, o Tênis Clube de Campinas. Sim, porque o número 1 
na escala social era a Sociedade Hípica, cuja maioria dos sócios podres de
 ricos também freqüentava o Tênis, embora o contrário não acontecesse 
(exceto quando éramos convidados para algum casamento realizado no 
gigantesco salão de festas daquele clube - não por acaso adaptado em uma
Casa Grande de algum antigo barão do café).

Sempre fui cercado por parentes e amigos que, mesmo sendo honestos e 
trabalhadores, não tinham a visão crítica necessária para compreender como
 as coisas funcionavam. Meus familiares limitavam-se a repetir o que ouviam, 
liam e viam na mídia, especialmente na rede Globo, nas revistonas e nos jornalões
 (que apoiaram o golpe militar, embora hoje finjam que não). Assim, tinham 
medo de comunistas, pois diziam que comiam criancinhas e dividiam a casa 
das pessoas ao meio (o fato de não termos imóvel próprio não parecia 
contradizer esse receio), achavam que Che Guevara era um “baderneiro 
profissional” (ser pago para fazer baderna, isso é que é profissão!), acreditavam 
que o Brasil tinha tantos problemas “porque pobre não gosta de trabalhar” 
(usar o salário mensal só para pagar contas e cobrir o rombo no cheque 
especial, imaginavam, não era coisa de pobre) e por aí vai.

Nem preciso dizer que, obviamente, eu também repetia tudo isso e acreditava 
no que estava falando, mesmo sem ter o menor embasamento teórico ou 
prático para tanto. Minha vida escolar foi uma piada. Estudei em colégio 
particular (de freiras!) do maternal ao ensino médio. Para se ter uma idéia 
do desastre que isso significa, nasci em 1971 e cheguei até o final da minha 
fase educacional básica sem nem saber que vivíamos sob um regime 
ditatorial ilegal e imoral.

Enquanto eu brincava no clube despreocupado, assistia à televisão ou 
passava a manhã inteira decorando datas e fórmulas matemáticas de 
maneira acrítica e alienante, centenas de brasileiros e vizinhos de continente
 eram torturados e mortos simplesmente por se opor àqueles regimes de 
direita. No máximo, eu ouvia algo como “Bem feito pra esses baderneiros, 
quem mandou serem 
do contra?” quando alguém tocava no assunto.

Se vocês acham que estou mentindo, relaciono abaixo fatos que marcaram
 essa fase lamentável da minha existência:

1) Vi o filme “Comando para Matar”, aquele em que o Arnoldão detona
 sozinho um exército inteiro de cucarachas sul americanos, nada menos
 do que seis vezes nos cinemas (e contava para todo mundo orgulhoso!);

2) Iniciava comentários com as frases “Eu vi na Veja” ou “Assisti na Globo”;

3) Ridicularizava quem dizia que existia racismo no Brasil, mesmo não tendo 
nenhum amigo ou conhecido negro, exceto a empregada que a gente 
desprezava, e repetindo “piadas” do tipo “sabe qual a diferença entre um negro
 e uma latinha de (censurado)?”;

4) Sentia prazer em irritar petistas, repetindo jargões que são usados até 
hoje (“Lula é vagabundo, ex-presidiário, arrancou o dedo para não precisa
r mais trabalhar”, “Sindicalista só sabe fazer baderna”, “Petista é tudo igual", 
"Se gosta tanto de Cuba, por que não vai prar lá plantar cana??”). Isso
 mesmo sem conhecer absolutamente nada de política, sociologia ou história;

5) Acreditava que o Stallone, o Arnoldão e o Chuck Norris lutavam pela
 liberdade, pela democracia e pela justiça para nos salvar dos vilões 
comunistas (eu tinha até pôster deles no meu quarto) e que os Bandeirantes
 foram corajosos desbravadores dos sertões brasileiros;

6) Vivia falando mal do Brasil e do “povo” brasileiro (do qual eu não fazia 
parte, é claro, afinal meus bisavôs eram europeus) e começava a concluir 
esse tipo de argumentação com a frase “Ah, mas lá nos Estados Unidos...”;
(porque naquela época, macho que era macho não via novela, a não 
7) Passava a tarde inteira e o domingo inteiro na frente da TV, assistindo qualquer
 porcaria, e só ia dormir depois de ver o Fantástico, sempre deprimido por 
lembrar que no outro dia voltavam as aulas e eu não havia feito a lição de
 casa nem decorado a matéria para as provas;

8) Cantava a música “Vamos Construir Juntos!” (que eu sei de cor até hoje!) e
 colecionava o álbum de figurinhas do “Paulistinha”, que faziam parte do 
marketing institucional do governo ditatorial para nos convencer que o Brasil
 era "o país do futuro";

9) Assistia às novelas da rede Globo, embora ficasse falando mal delas 
ser para reclamar);

10) Ficava realmente preocupado com a situação da Ponte Preta no 
campeonato paulista;

11) Comemorava toda vez que um novo McDonald’s era inaugurado no Brasil, 
pois era sinal de que o país estava progredindo (sim, eu também acreditei na
 ladainha sobre as maravilhas da "globalização neoliberal");

12) Queria ser astronauta da NASA quando crescesse (mas, desisti depois 
que me falaram que eles têm que ser bons em matemática);

13) Proferia afirmações como "não voto em partidos, mas em pessoas"
 (isso porque eu nem podia votar!), pois tinha aprendido que partidos eram
 coisas ruins e inúteis (assim, quando algum político de direita caia em desgraça,
 era culpa só dele, não do partido), especialmente aqueles que defendiam
 ideologias de esquerda;

14) Ideologia também era outro palavrão, coisa de baderneiro profissional, 
por isso eu também dizia, todo faceiro: "Não existe esse negócio de esquerda e 
direita, isso é coisa de gente revoltada que não gosta de trabalhar e só sabe 
ser do contra!"
Isso só para ficar no básico. Tenho certeza que você já testemunhou alguém
 falando ou fazendo coisas parecidas, certo?

Sinceramente, eu era um caso quase sem salvação. Mas a sorte sorriu para 
mim. Não fosse por alguns fatos que aconteceram em minha vida e serviram 
para abrir meus olhos, fatalmente eu seria hoje aquele mesmo adolescente
 alienado, ignorante e raivoso. Só que pesando 50 quilos a mais, com barba
 na cara e com um daqueles adesivos nojentos quatro-dedos dizendo "Fora
 Lula!" colado no vidro do carro (cuja prestação pagarei até 2010) .

Abordarei essa “transformação” em meu próximo texto sobre o assunto.

Leiam aqui a PARTE 2 das minhas "Memórias de Um Alienado".
http://tudo-em-cima.blogspot.com.br/2007/04/memrias-de-um-alienado-eu-tambm-j-tive.htm
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