quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Debate Caros Amigos: Para onde caminha a esquerda?


O tema foi apresentado e aprofundado no 1º Debate Caros Amigos sobre a Esquerda no Brasil, que aconteceu na última terça-feira (30) no Teatro da Universidade Católica de São Paulo (TUCA) Arena, em São Paulo.


Hamilton de Souza, editor da Caros Amigos, foi o mediador da mesa, que contou com as presenças de José Arbex, jornalista e professor da PUC-SP, José Reinaldo Carvalho, cientista político, jornalista e secretário nacional de Comunicação do PCdoB, Nilmário Miranda, jornalista, cientista político, dirigente do PT e presidente da Fundação Perseu Abramo, e João Paulo Rodrigues, dirigente do MST.

A proposta de encontrar elementos de convergência entre as mais diversas correntes de pensamento atraiu um público plural, formado principalmente por estudantes e militantes de diferentes movimentos e partidos.

O primeiro a falar foi Arbex, que atacou Lula, Dilma, o PT e o PCdoB. Disse que os partidos integrantes da coalizão de governo não são de esquerda. O professor de comunicação criticou a obra de Lênin “Que Fazer?”, por defender a existência de uma consciência revolucionária da vanguarda.

José Reinaldo reiterou o caráter marxista-leninista, revolucionário, classista e anti-imperialista do PCdoB. Sobre os desafios da esquerda, disse que precisam ser contextualizados no cenário de crise extensa, profunda, estrutural e sistêmica do capitalismo, assim como no quadro em que o imperialismo norte-americano e seus aliados intensificam suas políticas agressivas: “Entramos no caminho da barbárie, com os Estados Unidos exercendo a liderança unilateral e unipolar. Da guerra fria passamos à guerra quente da superpotência imperialista contra vários povos e nações. A humanidade está à beira do caos e a esquerda só pode elaborar estratégias e táticas levando em consideração esse cenário”, afirmou.

O secretário de comunicação do PCdoB alertou que as lutas sociais e de libertação nacional da atualidade necessitam de uma nítida definição programática. E defendeu que a luta pelo socialismo no Brasil passa pelos eixos democrático, nacional e social. Para ele, na luta política atual é necessário o protagonismo das massas populares e a unidade entre as forças progressistas e revolucionárias.

Reinaldo justificou o apoio da esquerda ao governo da presidente Dilma como contraponto às forças neoliberais e conservadoras, dentro de circunstâncias históricas muito concretas e numa determinada correlação de forças. Ao mesmo tempo pontuou: “Apoiar o governo não significa concordar com tudo o que está sendo feito, mas compreender que esse governo é um governo em disputa. Não aceitar esse desafio é adotar perspectiva de seita e deixar de ser uma alternativa política consequente”.

Em consonância com José Reinaldo, Nilmário Miranda, do PT, comentou que o Brasil é uma grande inspiração para o resto do mundo, porque “está construindo uma democracia de massa por meios pacíficos”. Ressaltou que há uma inversão de papéis na realidade contemporânea: no passado, os países europeus davam lições de civilidade, agora estão solicitando e bancando a intervenção na soberania dos países.

Nilmário lembrou que durante o governo do ex-presidente Lula o Brasil resgatou sua soberania, exemplificando com a rejeição à Alca.

Nilmário dividiu lições pessoais com o público; “Aprendi que a coligação de forças é o que decide. O governo vai até onde o povo quer que ele vá”. E compartilhou vivências que o ensinaram a ser menos “ansioso” com relação à sonhada chegada da revolução: “Encontrei o Pepe Mujica, presidente do Uruguai, que dirigiu os Tupamaros por 13 anos, e perguntei o que era, afinal de contas, revolução na opinião de um ex-guerrilheiro que hoje detém o poder. Ele respondeu que revolução é uma escada sem fim, não acaba nunca. E temos que subir por ela sempre, um degrau a cada dia”.

João Paulo, do MST, defendeu a necessária unidade da esquerda, enfatizando: “não podemos queimar pontes com aqueles que possuem opinião diferente da nossa porque no futuro, na hora de fazer a revolução, vamos precisar de todos, vamos precisar estar juntos”.

O dirigente enumerou uma série de problemas que freiam a ação da esquerda no contexto atual, um deles, e o mais grave, de origem “tática”, é o “descenso das lutas de massa”.

Lamentou que, nos últimos meses, tantos movimentos têm realizado manifestações separadamente, e defendeu a convergência.

Christiane Marcondes, da redação do Vermelho
http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_secao=1&id_noticia=162922

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Murilo Ferreira: A dinâmica do Partido Comunista





O Partido Comunista é uma organização de combate ao capitalismo. É comunista pelo que tem de conteúdo concreto, ou seja, seu elemento estruturante, o proletariado, mas o proletariado consciente de sua situação de classe - “classe para si”. É comunista pelo que tem também de conteúdo abstrato, isto é, seu conjunto de ideias - ideologia, política, cultura e prática - mais precisamente seu pensamento tático e estratégico ou sua práxis.

Por Murilo Ferreira*


Uma práxis revolucionária, transformadora, que caminha para um ponto chave de ruptura com o sistema do capital e que se direciona, com firmeza estratégica, para a construção de um mundo novo, o mundo do socialismo.

Essa organização pretende crescer e conquistar o poder, pois pouco ou nada de seu pensamento poderá se materializar se ele se encontrar em outras mãos. E conquistá-lo é uma condição primeira para qualquer organização partidária realizar o seu conteúdo ideológico. Esse processo não é nada fácil, é uma luta em si, pois leva não somente a uma substituição de um partido pelo outro, mas a derrota de uma classe, a burguesia — que há 400 anos exerce o seu domínio — e a vitória de outra, o proletariado — que pouca experiência teve com o exercício do poder — portanto, é uma luta de classes.

Crescer e conquistar o poder constitui um só processo, podendo ele ser ou não revolucionário. Uma organização pequena dificilmente poderá mobilizar energias e dar iniciativa e impulso às transformações; mas também por si só uma grande organização, mesmo que venha a conquistar o poder, também não é garantia de que se terá iniciado uma nova fase revolucionária. Então o decisivo é o processo de crescimento — é não se perder no meio do caminho — pois uma vez que no processo de crescimento vai-se perdendo substância revolucionária, isto é, “esvaziando-se” a ideologia, acaba ocorrendo uma transfiguração para outro tipo de organização, certamente não proletária e de conteúdo ideológico estranho ao socialismo.

A luta de classes pela conquista do poder é uma luta extremamente desigual e difícil. A classe dominante dispõe de instrumentos de repressão - a violência pura e simples - mas também de instrumentos ideológicos, que fazem com que as vítimas do próprio sistema acabem consentindo com sua própria condição. Então, como diz Gramsci, existem duas formas de domínio - a força e o consenso. Para a efetiva realização da produção capitalista é necessário que haja também um ambiente minimamente pacífico, isto é, que o processo de luta de classes não se degenere a tal ponto que se crie óbices à livre circulação e acumulação de capital. Então, a segunda forma, o exercício do poder através do consenso é a forma preferida da dominação do capital, sabendo-se que a burguesia, em última instância, jamais abrirá mão de lançar a mais perversa onda de violência contra quem quer que a ameace.

Dos regimes patrocinados pela burguesia — dentre eles o regime do terror e o regime democrático — o que nos interessa é o segundo. Não que o regime democrático vá além dos limites da dominação burguesa, mas porque simplesmente este regime nos permite mais liberdade de organização e condições melhores para fazer o debate político e teórico com a sociedade, forjando consciência revolucionária e substância para a transformação social. Não é a toa que a formulação marxista de que à medida que o capitalismo se desenvolve ele cria os seus próprios elementos de superação é absolutamente atual, pois se esse ambiente de relativa tranquilidade caracterizada por um amplo consenso ideológico de conteúdo liberal e mercadológico contribui para o desenvolvimento do capital, também contribui para o desenvolvimento do partido comunista, à medida que sob esse regime democrático, ao contrário do regime do terror, ele consiga realizar não somente a luta política partidária, mas também a luta de ideias.

Portanto, o regime democrático proporciona que o Partido Comunista possa realizar ações e intervenções em várias esferas da sociedade. Dizer que o partido comunista tem que se firmar entre os trabalhadores está dado desde 1848 quando Marx e Engels escreveram o Manifesto do Partido Comunista. Aliás, o partido é o próprio proletariado - em nada pode se distinguir dele - mas um proletariado diferenciado, isto é, enquanto “classe em si”. No próprio conceito de proletariado já está embutido essa caracterização, senão não seria proletariado, seria apenas uma massa atônita, desraigada e estéril na luta pelo socialismo, elemento até para engrossar as fileiras da classe dominante. Portanto, o proletariado é uma classe organizada, que é mesmo que o partido comunista. O partido comunista, por sua vez, não poderá ser outra coisa senão o próprio proletariado organizado, ambos absolutamente convictos do seu papel na história.

Mas nesse desafio de crescer está posto a necessidade de enfrentar a luta em diversas esferas da sociedade. E mais do que isso, de se inteirar do que é mais atual em política e em economia, isto é, da atualidade da luta de classes e do curso real dos acontecimentos, como se move o capitalismo, o mundo, as nações, as diversas sociedades e suas classes e frações de classe, enfim, do movimento dialético da história. Um partido comunista deve saber fazer esse estudo, adquirindo consciência e sabedoria do momento presente e do que pode vir a ser o futuro imediato, vindo assim a formular a sua tática, que vem a ser o seu posicionamento político frente ao enquadramento mais geral - diversas forças políticas e a sociedade.

Hoje, ainda sob o efeito avassalador da derrota das experiências socialistas do século 20, a forma atualizada de dominação do capital é o neoliberalismo – livre circulação de capital, hegemonia do capital financeiro, desregulamentação, privatização e desnacionalização, enfim, um regime que tem como objetivo central destruir a soberania das nações e controlá-las ou dirigi-las a partir de um único centro de comando mundial, o centro do capital financeiro: EUA. Assim, a tática mais geral dos comunistas na atualidade é derrotar o sistema neoliberal e fazer vitorioso o Projeto Nacional de Desenvolvimento, haja vista que a luta pelo socialismo não está posta de maneira imediata.

Ainda citando Gramsci, que dizia ser preciso que o proletariado se lance a um processo de conquista da hegemonia política e cultural mesmo antes da conquista do poder. Assim esse trabalho de construção hegemônica aqui para nós tem se dado pela luta de posição, em contraposição à tática de “tomar” poder por uma grande movimentação. E nisso está o elemento chave que é o da disputa de consciência nas várias esferas sociais e até mesmo a disputa da consciência de um operário que seja. Cada posição ganha, cada “trincheira” conquistada, se somará ao final, num processo relativamente longo de acumulação de forças.

Assim, a luta ideológica coloca-se no mesmo patamar de importância ao posicionamento tático partidário e da luta política imediata.

Não se trata de colocar a ideologia à frente da política, pois sabemos o quanto a luta política imediata é fundamental para inserir a organização partidária no curso real da história. Mas se trata de equilíbrio e interação dialética entre ambas as frentes, sem descuidar de nenhuma. O maior alerta é que nesse processo de conquista de hegemonia estamos obrigados a fazer concessões a outras classes aliadas na luta contra a hegemonia da burguesia financeira. Essas concessões e alianças são necessárias, pois esse tem sido o caminho para fazer o partido crescer e aumentar sua influência, como tem ocorrido. Acrescente-se a isso o processo de abertura partidária a quadros e elementos diferenciados da sociedade, com concepções e ideais também diferenciados. Portanto, é nesse quadro que temos que cuidar melhor do papel da consciência e da cultura como arma contra o pragmatismo.

Por outro lado, o reforço ideológico também não pode vir desacompanhado da compreensão tática e da sua função de inserção partidária no movimento real. O desafio é estabelecer uma estreita relação entre a luta política imediata e a consciência ideológica do socialismo, isto é, relação dialética entre tática e estratégia, sendo a tática a serviço da estratégia ou a luta política imediata a serviço do socialismo. Mas ainda assim a concepção ideológica do militante é o maior patrimônio partidário. Já as conquistas políticas imediatas, embora importantes para a luta cotidiana, podem se tornar efêmeras frente a um contexto adverso. A soma das posições partidárias mais a elevação geral do nível da consciência de seus militantes é o caminho mais próximo para o socialismo.


* Murilo Ferreira é engenheiro agrônomo e mestre em Administração Rural e Desenvolvimento. Também atua na direção do Sinpro e da CTB Minas.


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