segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Comunistas aprovam orientações para o combate ao racismo no país



O Encontro Nacional do PCdoB: Desafios da luta contra o Racismo e às Desigualdades Sociais, realizado neste sábado (3) e domingo (4), na sede do Comitê Central do Partido, em São Paulo, definiu uma série de orientações e propostas coletivas para o enfrentamento do racismo no país.
Os debates e as mesas de discussões reuniram lideranças comunistas de diversos estados brasileiros que atuam na frente. A ministra chefe da Secretaria de Políticas da Promoção de Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), Luiza Bairros, foi uma das palestrantes do evento.

Para a vereadora e coordenadora nacional de Combate ao Racismo, Olívia Santana (PCdoB-BA), o encontro ajudará o Partido estabelecer uma forma ainda mais qualificada para sua participação no “enfrentamento dessa chaga que ainda desiguala o povo brasileiro”.

Ela reforça que o documento retrata a qualidade das discussões e o debate de ideias realizado durante os dois dias de evento — que contaram ainda com a participação do presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, da vice-presidente nacional do Partido, Luciana Santos e de outros dirigentes nacionais.

Olívia explica que o documento — que deverá ainda ser submetido ao Comitê Central do PCdoB — servirá de base para a orientação da militância comunista e o diálogo com outras forças partidárias. “Não tenho dúvidas que o Partido dá uma contribuição importante a essa concentração de forças políticas através desse documento que sistematiza um conjunto de orientações políticas para o enfrentamento ao racismo e às desigualdades sociais no Brasil”.

O objetivo é que as ideia é que esse repercuta ainda na construção dos programas dos candidatos do PCdoB nas eleições do próximo. “É muito importante dar vida material a esse documento para que ele seja uma ferramenta que possa auxiliar a nossa atuação em relação aos projetos eleitorais que o Partido participará em 2012”.

Leia abaixo a íntegra do documento:

O PCdoB e a luta estratégica de superação do racismo no Brasil.

1. O Encontro Nacional “Desafios da luta contra o racismo e as desigualdades sociais” realizado em São Paulo nos dias 3 e 4 de dezembro de 2011, convocado pela Secretaria Nacional de Movimentos Sociais, a partir da Coordenação do PCdoB de Luta Contra o Racismo e a Intolerância Religiosa, reuniu militantes comunistas da frente de luta contra o racismo de nove estados e aprovou as seguintes diretivas.

2. O PC do B compreende que o racismo é um fenômeno social, ideológico e político deletério ao desenvolvimento e à democracia do Brasil e do mundo. A defesa da questão nacional, a luta dos trabalhadores e a liberdade do povo brasileiro envolvem o enfrentamento aos problemas raciais e a efetivação da igualdade de oportunidades para as populações negras e indígenas, conforme Resolução “A luta contra o racismo é parte integrante do projeto de emancipação nacional e social”, aprovada em 2005, bem como as formulações que constam no Estatuto e no Programa do partido.

3. É parte do esforço teórico do PC do B desenvolver uma formulação política sobre a problemática do racismo, suas manifestações contemporâneas e as estratégias necessárias a sua superação, numa perspectiva marxista, que possa responder os desafios de hoje e da construção do socialismo em nosso País.

4. O racismo é um tema que se apresenta à agenda de lutas dos comunistas, exigindo respostas na ação prática cotidiana, mas também no plano das idéias. Os problemas que envolvem negros e brancos não são resultados de uma essência humana que naturalmente os desigualam. Ao contrário, a essência humana é resultado do processo histórico, conforme afirma Marx, e como tal demanda esforço sobre a realidade concreta para compreendê-la e transformá-la. A luta contra a discriminação racial é parte da luta de classes e, por isso, deve constar na agenda dos trabalhadores, das mulheres, dos estudantes e todas as lutas democráticas por transformação social.

5. A problemática do racismo no mundo está inserida no processo de globalização do capitalismo, na nova divisão transnacional do trabalho, na emergência de um novo quadro geopolítico e econômico mundial, bem como nas crises econômicas, ambientais, de produção e consumo de alimentos; nas revoltas, guerras e revoluções que ocorrem na Ásia, África, Médio Oriente, Europa e em países do continente americano.

6. Questões locais, nacionais e regionais, que compreendem implicações econômicas, políticas e culturais, trazem consigo manifestações e decisões racistas e discriminatórias recentes, antigas, evidentes e sutis. Essas tensões estão presentes nos protestos e derrubadas de regimes e de dirigentes nacionais no Mundo Árabe, no Sudão, Somália, Líbano e Egito. O componente étnico é também um fator de perturbações na Itália, Espanha, Grécia, França, Inglaterra. Situação que se repete na Bolívia, Venezuela, Peru, Haiti, entre outras nações latino-americanas e asiáticas.

7. O Brasil é marcado pelo processo doloroso da escravidão e do colonialismo, responsáveis pela perseguição, destruição e genocídio de indígenas e negros. Mas é também um País cuja resultante desse mesmo processo e o encontro das culturas indígenas, africanas, européias e asiáticas, conformam a identidade e diversidade cultural do seu povo; fenômeno singular no mundo e base fundamental da sua formação social, política e econômica. Referência importante na quadra internacional.

8. Entendemos que o racismo no Brasil não pode ser considerado apenas como mazela residual do período escravista. O racismo é reinventando todos os dias pelo capitalismo, sistema excludente por excelência. Portanto, o enfrentamento ao racismo é uma luta estratégica, que requer a superação da própria sociedade.

9. Nesse sentido, é preciso atualizar o debate e incorporar a experiência vivida pelos comunistas no movimento social e em governos, valorizando o exercício da ação e reflexão sobre a política e os caminhos que podem nos levar ao aprofundamento da democracia e o avanço da luta contra o racismo estrutural no país.

10. Desde o primeiro governo do presidente Lula, e agora com a presidente Dilma Roussef, o Brasil tem construído as bases para um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Além da ampliação de postos de trabalho, os programas sociais do governo a exemplo do Bolsa Família, a ampliação do poder de consumo das classes C, D e E, o Prouni, o Minha Casa Minha Vida vêm movimentando a base da pirâmide social e incorporando parcelas dos que viviam na pobreza e em situação de miserabilidade. A presidente Dilma ao tomar posse elegeu como foco do seu governo o enfrentamento à miséria, a busca da erradicação da pobreza extrema, a universalização dos serviços básicos, a valorização do SUS, entre outras importantes bandeiras. Tais medidas atingem principalmente à população negra, que constitui a maioria dos pobres da nação.

11. Entretanto, além dos programas sociais, o Brasil precisa de ações estruturais que consolidem o desenvolvimento social e econômico. Conforme aprovamos no nosso 12º Congresso, a concretização de um conjunto de reformas democratizantes é fundamental para a transformação do Estado brasileiro, a exemplo das reformas política, educacional, tributária, agrária, urbana, dos meios de comunicação, do Sistema Único de Saúde (SUS), da seguridade social e da segurança pública.

12. Para além da desigualdade social que se reproduz cotidianamente, há um passivo a ser resgatado em relação à população negra brasileira. Por isso, na esteira de políticas universais devem ser acrescidas políticas específicas de eliminação do racismo, a exemplo do combate às desigualdades salariais baseadas na cor da pele e de políticas públicas que promovam a inclusão da população negra e indígena aos avanços educacionais, tecnológicos, econômicos e sociais que o Estado brasileiro é capaz de gerar.

13. A Declaração e o Plano de Ação aprovados na III Conferência Mundial Contra o Racismo, a Xenofobia e Formas Conexas de Intolerância ocorrida em 2001, apesar de todo o boicote feito pelos EUA e seus aliados, tiveram um importante impacto no Brasil e em outros países signatários de tais documentos. Nos últimos anos o Brasil criou a SEPPIR, o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, realizou conferências nacionais de promoção da igualdade e aprovou um Plano de Ação e um conjunto de medidas legais para enfrentar o racismo e elevar as condições de vida da população negra.

14. Foram adotadas políticas de cotas para estudantes pobres, negros e indígenas em mais de 123 instituições públicas de ensino superior, em diversos estados brasileiros, fruto da luta dos movimentos negro e estudantil. O recorte social e racial tem possibilitado uma mudança da composição dessas instituições, oportunizando que segmentos que viviam à margem comecem a ocupar mais espaços na academia. Também o Itamaraty adotou o Programa de Bolsa-Prêmio de Vocação para a diplomacia, abrindo oportunidade para negros entrarem no restrito funil da carreira diplomática no país. O Decreto 4887/03, alvo de duros ataques proferidos pelo DEM, promove o reconhecimento e titulação das terras de comunidades quilombolas e o Programa Brasil Quilombola integra as políticas públicas realizadas pelos ministérios voltadas para essas comunidades.

15. No mercado de trabalho é tarefa dos comunistas lutar por igualdade salarial para negros e brancos, por oportunidade de qualificação e especialização de mão de obra e pelo estabelecimento de mecanismos que ampliem a participação de homens e mulheres negros nos postos de planejamento e gestão de empresas estatais e privadas.

16. Houve um crescimento do ensino superior privado no Brasil, desde os anos 1960. Ao longo dos anos houve uma proliferação das faculdades privadas, especialmente na década de1990. Este setor representa 75% das matrículas na graduação. A má qualidade de muitas dessas instituições vem levando o MEC a descredenciá-las. Milhares de jovens trabalhadores, negros e brancos de famílias pobres têm vivido a ilusão de que estão galgando uma formação acadêmica, mas acabam sendo vítimas de uma formação que não lhes garante efetiva qualificação profissional. Frente a esse quadro, é importante que, além da defesa das cotas como política de ação afirmativa, os comunistas proponham ao movimento social negro que incorpore na sua agenda a luta pela valorização da universidade pública, gratuita e de qualidade, e a luta pelo investimento de pelo menos 10% do PIB para a educação.

17. O PC do B é parte da construção da agenda de avanços do governo brasileiro com quadros que colaboraram na SEPPIR, na Fundação Cultural Palmares, que colaboraram de forma decisiva para a elaboração e aprovação do Estatuto da Igualdade Racial. Proporcionalmente estamos entre os partidos com maior número de parlamentares negros, temos engajamento propositivo nos Parlamentos, com projetos de leis aprovados, de deputados e vereadores em todo país. Há importantes experiências de gestão em alguns estados, ocupando coordenações, assessorias e até secretarias de promoção da igualdade.

18. A política de desenvolvimento e fortalecimento da nação tem conseguindo mexer com o fosso que separa ricos e pobres na estrutura social. A renda dos a20% mais rico que era em média 24,3 vezes maior que a dos 20% mais pobres, reduziu para 17,8% em 2009, uma queda de 6,5%. Entretanto, o retrato das desigualdades sociais no Brasil revela que os aspectos de raça e gênero têm grande relevância na produção de iniquidades, já que negros e mulheres são os grupos mais vulneráveis.

19. A PNAD de 2010 aponta que as mulheres ocupadas ganham em média 70,7% do que ganha um trabalhador homem. E analisando o rendimento hora dos trabalhadores a partir do critério racial constatou-se que negros e pardos ganhavam em média 57,4% para cada um dos dois grupos do rendimento de um trabalhador homem branco. É nas regiões Norte e Nordeste do país que está concentrada a maior parte das populações negra e indígena. Coincidentemente são as regiões com maiores carências de infraestrutura, serviços públicos de saúde e educação, geração de emprego e renda entre outros elementos essenciais à promoção da qualidade de vida. A garantia de acesso ao saneamento básico ainda é algo que o país não conseguiu garantir a todos os domicílios e famílias brasileiros. Embora haja avanços, já que de 1999 a 2009 o país saiu de 57,2% para 62,6% de cobertura, persiste as desigualdades regionais. Na Região Norte, apenas 13,7% dos domicílios urbanos tinham acesso integrado aos serviços de saneamento básico, como ligação á rede de abastecimento de água, rede coletora de esgoto e coleta de lixo. No Nordeste a situação melhora, subindo para 37,0%, mas ainda não se atinge os índices adequados. Mas é no Sudeste que há um salto significativo, já que 85,1% dos domicílios contam com a cobertura adequada de tais serviços.

20. A Educação é uma das principais áreas estratégicas para o desenvolvimento da nação, para a realização do Estado verdadeiramente republicano e democrático. Também neste campo as chagas das desigualdades se expõem a reclamar tratamento. A taxa de analfabetismo das pessoas que se declararam pardas é de 13,3%, das pretas de 13,4% e brancas 5,9%. No outro extremo estão as pessoas de 25 anos que concluíram o nível superior. Estas estavam distribuídas da seguinte forma: pardas e negras saíram de 2,3% em 1999 para 4,7%, pretas 5,9% respectivamente, enquanto as brancas saíram de 9% para 15%.

21. A violência urbana vem tomando proporções preocupantes no Brasil e ceifando vidas principalmente de jovens. Acidentes assassinatos são as maiores causas externas responsáveis pelos óbitos. O IPEA aponta as agressões como o motivo que mais matou negros no país (50%), seguida por acidente de trânsito (24%). Já entre os brancos os acidentes de transito são responsáveis por 35% das mortes, seguidos de agressões, 31%. Na faixa etária de 15 a 29 o índice de mortes violentas, chega a 10%, entre os jovens negros contra 4% entre jovens brancos.

22. Diante de tal quadro, cabe aos comunistas lutar pela superação das desigualdades raciais defendendo políticas públicas voltadas para a eliminação de barreiras discriminatórias impostas pelo racismo no mercado de trabalho, buscando a ampliação de oportunidades para a população negra. Estamos no governo federal participando do Ministério de Políticas de Promoção da Igualdade, SEPPIR e da Fundação Cultural Palmares e colaborando com a construção e realização de políticas públicas voltadas para a população negra, incluindo as comunidades tradicionais quilombolas, e tivemos destacada atuação na elaboração do capítulo de promoção da igualdade racial do Plano Brasil 2022, produzido pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, através do diálogo entre governo e movimentos sociais.

23. Na dimensão internacionalista, devemos incorporar à nossa agenda a defesa do fortalecimento e desenvolvimento social, econômico e político do Continente Africano, do Haiti e dos povos que sofrem com a fome, as doenças e as guerras. Exigir das potências imperialistas ações efetivas apoio às nações africanas em situação de subdesenvolvimento, a exemplo de quebra de patentes de medicamento, transferência de tecnologia, e o fim de cobranças das injustas e impagáveis dívidas externas.

24. A luta pela paz e a defesa dos direitos humanos deve dar relevo ao combate ao racismo, a xenofobia e a intolerância rumo à transformação da sociedade em todas as suas dimensões, por um projeto humanista e socialista.

25. A estratégia do PCdoB na luta de combate ao racismo é, em última instância, a luta pela construção do socialismo como única forma de se avançar na construção de uma nova sociedade, capaz de superar as desigualdades sociais e oferecendo melhores condições materiais de eliminação do racismo e das desigualdades de gênero.

Ações políticas e organizativas:

26. Instituir as Coordenações Estaduais de Combate ao Racismo para organizar o Partido nas ações de combate ao racismo e promoção da igualdade racial tendo em vista o amadurecimento da proposta de criação, no partido, de uma Secretaria Nacional de Combate ao Racismo.

27. Indicar ao Comitê Central a convocação da I Conferencia de combate ao racismo e às desigualdades sociais.

28. Estimular e apoiar a participação de quadros negros nas instâncias de direção do PCdoB.

29. Realizar Seminários de Combate ao Racismo nos estados.

30. Fortalecer a ação política de massas do PC do B na luta contra o preconceito, a discriminação racial e a intolerância religiosa.

31. Estudar o documento que resulte do Encontro Nacional de Combate ao Racismo nos cursos de formação e socializa-lo como orientador da nossa ação política de massas.

32. Elaborar um balanço crítico sobre a atuação dos comunistas, resgatando nossa experiência na luta anti-racista e presença no debate racial.

33. Estimular e acompanhar a implementação de políticas públicas de combate ao racismo nas administrações públicas dirigidas pelo PC do B e criar órgãos competentes para este fim.

34. A aprovação do Estatuto da Igualdade Racial foi uma conquista importante da sociedade brasileira rumo à superação do racismo no Brasil. Devemos agora lutar pela sua regulamentação e implementação.

Fonte:
http://www.pcdob.org.br/noticia.php?id_noticia=170255&id_secao=3

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